Por Lanna Silveira
Em 2025, o artista FBC – um dos nomes mais proeminentes do hip hop brasileiro – celebra seus 20 anos de carreira em uma turnê nacional: FBC: 20 Anos. O repertório da turnê passa pelos grandes sucessos do cantor desde o lançamento de seu primeiro álbum solo, em 2018, até seu último trabalho, lançado neste ano. O rapper mineiro, também conhecido como “padrim” ou simplesmente Fabrício, construiu uma carreira repleta de hits, marcada pela versatilidade de estilos e pelo forte posicionamento político do artista.
Passado
Apesar de seu primeiro trabalho solo ter sido lançado somente em 2018, o envolvimento de FBC com a música é bem mais antigo. Uma das primeiras influências musicais consideradas importantes para o desenvolvimento artístico de Fabrício foram seus primos, que tinham uma banda punk – da qual FBC assistia a ensaios e gravações. O contato próximo com o rock o fez aprender a tocar bateria, aos 10 anos, e formar a sua própria banda aos 12: um grupo cover da banda de grunge Nirvana.
A afiliação de Fabrício ao hip hop – em especial, ao rap – não surgiu, inicialmente, por um apreço ao gênero; FBC explica que, após se envolver com grêmios estudantis na época do Ensino Fundamental, que o fizeram ter contato com muitas pessoas engajadas politicamente, ele enxergou, no rap, uma oportunidade de falar sobre os problemas sociopolíticos que existiam no Brasil.
“O rap é o lugar onde eu mais consigo conversar com a minha comunidade politicamente. (…) O rap veio para mim não como uma oportunidade de fazer música, mas sim como uma oportunidade de fazer política. Além de política, eu conseguiria exercer no rap a função de ser humano; o que eu quero fazer da minha vida, da minha trajetória”, explica.
Inevitavelmente, FBC acabou se apaixonando pelo gênero e compreendendo todas as implicações sociais do hip hop no Brasil. Essa afeição se formou, de fato, com a entrada de Fabrício na cena urbana do movimento hip hop belo-horizontino: especificamente, no Duelo de MCs, do qual o artista participou consistentemente por cerca de oito anos. Com a vivência na cena, Fabrício passou a entender o rap como um instrumento de resistência de povos marginalizados socialmente, como a comunidade negra e os povos originários.
Presente
Na década de 2010, FBC começa a caminhar em direção de uma profissionalização musical: de 2015 a 2018, o rapper fez parte do grupo DV Tribo, com outros cinco artistas da cena mineira. Entre eles, o rapper Djonga, que também viria a se tornar um dos maiores nomes do rap brasileiro. Após o fim do grupo, FBC lança seu primeiro álbum solo, “S.C.A.”, que já demonstrava as bases principais de sua persona artística: a exploração de estilos do hip hop, unidos a letras afiadas que retratam realidades sociais.
Nos anos seguintes, Fabrício emendou uma série de lançamentos. Entre os principais álbuns de estúdio, estão: “Padrim” (2019), que foi seu primeiro trabalho a viralizar nas redes sociais; “Best Duo” (2020); “Baile” (2021), que trouxe FBC ao cenário mainstream com hits virais como “Delírios” e “Se Tá Solteira”; “O amor, o perdão e a tecnologia irão nos levar para outro planeta” (2023); e “Assaltos e Batidas” (2025).
Fabrício afirma estar em um momento artístico em que a “brasilidade” – tanto no que diz respeito a estilos musicais, quanto a vivências e realidades – está aflorada em seus trabalhos. O cantor, que acredita que a arte é um lugar de evolução, explica que o seu processo criativo é altamente influenciado por um processo de estudo constante que faz questão de manter. Esse estudo não consiste apenas em aprender mais sobre técnicas musicais, mas também conhecimento de mundo e teorias políticas. Como um exemplo, o artista conta que, atualmente, está fazendo a leitura de “Os Jacobinos Negros”: obra que explora detalhes sobre a Revolução Haitiana – a única revolta promovida por uma população escravizada que conseguiu vencer o regime monárquico. “Revisitar o passado é uma evolução musical”, categoriza.
FBC também garante que é um ouvinte assíduo de todo e qualquer tipo de gênero e estilo musical. A diversidade de seu gosto musical se reflete por toda a sua obra, que apresenta diferentes propostas de experimentar o hip hop e a black music, de forma geral. Enquanto álbuns como “S.C.A.” e “Padrim” exploram marcas de estilo do trap, “Baile” é uma ode ao miami bass que dominava as produções do funk melody noventista. “O Amor, o Perdão e a Tecnologia Irão nos Levar Para Outro Planeta”, por sua vez, brinca com elementos do disco, da house music e do ampiano, remetendo fortemente o soul brasileiro setentista.
Seu álbum mais recente, “Assaltos e Batidas”, marcou o retorno de FBC a uma sonoridade mais facilmente reconhecida como hip hop pelo público. Com instrumentais com referência forte ao rap noventista, FBC cita como influências da construção sonora do álbum artistas como Cypress Hill, Lords Of The Underground, Das EFX, Wu-tang Clan e Racionais MC’s. Fabrício faz questão de destacar o papel de Coyote Beatz e Pepito, produtores do disco, na criação de toda a estética que envolve o álbum; tanto na imagem, quanto no som.
Tematicamente, o álbum se estabelece como um grito de revolta do povo brasileiro. A crítica social e o posicionamento político marcam presença em todas as letras do álbum; com destaque para “Você pra Mim É Lucro”, que oferece apoio ao recente movimento da política brasileira que pede o fim da escala 6×1, e “A Voz da Revolução”, que propõe uma postura ativa de resistência da classe trabalhadora ao sistema capitalista.
Futuro
Mesmo com um lançamento recente, o público não vai ficar carente de FBC por muito tempo: ainda em outubro, o cantor anunciou um lançamento para 2026: “Os Porcos Vem Aí”. O trabalho, que já está finalizado, será o primeiro de sua carreira profissional a explorar o rock, marcando um retorno de Fabrício às suas origens artísticas. Apesar da falta de representação em sua discografia, FBC se declara como um grande entusiasta do gênero.
Uma pequena prévia da proposta a ser apresentada pelo álbum já foi divulgada pelo artista nas redes sociais: um trecho da canção “Canudos”, cujo instrumental flerta com subgêneros do rock como hardcore, metal e nu-metal. A letra da música, que expõe todas as reivindicações sociais levantadas pela histórica Guerra de Canudos, demonstra a necessidade que o cantor sente em produzir mais um trabalho que dê voz às insatisfações do povo brasileiro. “A gente [no Brasil] está com raiva de algumas coisas né? A gente precisa desse lugar para [gritar]. Rock, pra mim, é isso”.
Fabrício acredita que suas conquistas pessoais e profissionais ao longo de seus 20 anos de carreira não são importantes se toda a população brasileira também não tiver a oportunidade de ser bem sucedido. Para o artista, a verdadeira felicidade e satisfação pessoal sempre partirá do bem estar coletivo.
“Eu só acredito na vitória coletiva. [Pra mim], não importa se tô ganhando dinheiro enquanto o trabalhador estiver na jornada 6×1 e ganhar um salário que não condiz com a jornada de trabalho dele. [Isso tudo] é uma luta pela dignidade do ser humano. A dignidade que ele deve ter pra conseguir viver sua própria vida. (…) Pra viver uma vida boa, o coletivo tem que estar bem, e para [alcançar] isso a gente precisa rever um monte de coisas [no sistema brasileiro]”, conclui.
 
			         
			         
								 
											 
				 
								