O Tesouro Nacional apontou situação financeira frágil em 9 das 27 empresas estatais federais, entre elas companhias que prestam serviços essenciais, como a operação de aeroportos, a cunhagem de moeda e o serviço postal.
Estão na lista elaborada pelo Tesouro a Casa da Moeda do Brasil, os Correios, a ENBPar (Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e Binacional), a Infraero e cinco companhias docas: CDC (Ceará), CDP (Pará), Codeba (Bahia), CDRJ (Rio de Janeiro) e Codern (Rio Grande do Norte).
O alerta consta do 7ª Relatório de Riscos Fiscais da União do Ministério da Fazenda. O documento anual, divulgado na sexta-feira (7), tem a função de mapear de forma sintética a situação dos riscos fiscais aos quais o governo federal está exposto e identificar os eventos que podem gerar desvios em relação ao planejamento das contas públicas.
Um aporte numa estatal representa uma despesa no Orçamento da União, que pode implicar no comprometimento das contas públicas.
Ao todo, o governo tem 22 empresas públicas e cinco sociedades de economia mista.
Auxílio financeiro
De acordo com o relatório, a ENBPar, que administra a Eletronuclear, está exposta ao risco de aporte de recursos da União por conta da situação da Eletronuclear, que demanda altos investimentos para Angra 1 e para a conclusão da construção de Angra 3. Como mostrou a Folha, a Eletronuclear pediu socorro de R$ 1,4 bilhão ao governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para conseguir honrar pagamentos que vencem até o fim de 2025. A empresa prevê um rombo no caixa a partir de novembro.
No caso dos Correios, o documento relata que a estatal segue em trajetória de deterioração em seus resultados, com risco de necessidade de auxílio financeiro. O governo articula um empréstimo para a estatal de R$ 20 bilhões com bancos públicos e privados, com aval do Tesouro.
Embora confirmado pelo comando da empresa, o empréstimo depende aval técnico do órgão, o que exigiria a abertura de uma exceção dada a fragilidade de suas condições financeiras. A negociação do empréstimo não foi citada no relatório.
Em situação financeira bastante delicada, os Correios registraram um prejuízo de R$ 2,64 bilhões no segundo trimestre de 2025. O rombo é quase cinco vezes o resultado negativo verificado em igual período de 2024, quando ficou em R$ 553,2 milhões.
No caso da Casa da Moeda, o Tesouro relata que, apesar do aumento na receita interna, houve queda de 74% no lucro líquido em 2024 e resultado operacional negativo. “Entretanto, mantém liquidez para cobrir passivos”, diz o relatório.
O documento cita que a Infraero, por sua vez, registrou prejuízo de R$ 228,7 milhões e queda de 71% na receita líquida, impactada pela concessão de aeroportos, e elabora novo plano de negócios visando sua sustentabilidade, sem especificar os detalhes.
O relatório destaca que a Codern apresenta risco de deterioração financeira devido a arrendamentos, necessidade de investimentos em infraestrutura e a possível desvinculação do Porto de Maceió, responsável por 72% da sua receita líquida em 2024.
Não há citações específicas no documento sobre as outras quatro docas, que também enfrentam dificuldades de caixa, de acordo com a análise do Tesouro.
Já a situação de caixa da Emgea (Empresa Gestora de Ativos) apresentou melhoria significativa no último exercício, fator que diminuiu o risco de aporte de recursos, apesar de ele ainda existir.
No relatório do ano anterior, o Tesouro havia alertado que a Emgea tinha um histórico de dificuldades em seu fluxo de caixa e que avaliava como possível a realização de aportes nos próximos anos, caso os fluxos de receitas de seu principal ativo, os créditos CVS (títulos públicos emitidos pelo Tesouro) junto aos bancos e agentes financeiros, não apresentem boa performance.
A empresa possui dívidas com o FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), que são garantidas pela União. Elas têm sido objeto de renegociação ao longo dos últimos exercícios.
Para 2025, o governo projeta déficit de R$ 6,2 bilhões nas contas das estatais federais e de R$ 6,7 bilhões em 2026.
Bancos
O Tesouro avalia que o risco de aporte emergencial é remoto para os bancos estatais federais: BB (Banco do Brasi), Caixa Econômica Federal, BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), BNB (Banco do Nordeste) e Basa (Banco da Amazônia).
Os riscos fiscais das empresas estatais não dependentes (aquelas que cobrem suas próprias despesas com receitas próprias) podem aparecer por frustração no repasse de dividendos e JCP (Juros sobre Capital Próprio) abaixo do estimado, ou pela necessidade de aporte de capital ou subvenção econômica para suprir necessidades de recursos da estatal.
“No que diz respeito às empresas estatais, é considerado remoto o risco de frustração de receitas de dividendos e de juros sobre capital próprio. Entretanto, é considerado o risco possível de necessidade de aporte emergencial, devido, principalmente, às dificuldades concretas que algumas empresas enfrentam,” diz o relatório.
Na análise dos cinco bancos federais, o Tesouro apontou que todos eles apresentaram os índices de capital acima dos mínimos regulatórios.
A orientação do contralador é que todas as instituições financeiras mantenham margem de segurança de forma a mitigar eventuais choques ao longo do ano. Em 2025, foram recebidos, no 1º semestre, R$ 23,7 bilhões (56,5%) dos R$ 41,9 bilhões estimados em dividendos e JCP, reduzindo a probabilidade de perdas relevantes na arrecadação dessas receitas.
No BNB, existe risco possível de não pagamento de dividendos por processos em órgãos de controle, mas o Tesouro diz que a relevância dos valores para as contas públicas é baixa.
No relatório, o Tesouro projeta ainda que ao final de 2025, estima-se que a dívida bruta do governo alcance 79,0% do PIB -um crescimento de 2,5 pontos porcentuais em relação ao encerramento de 2024. Projeta-se que a dívida siga uma trajetória ascendente até 2028, quando atingiria 84,2%, apresentando ligeira queda ao final do horizonte de estimativas, com 81,7% do PIB em 2035.
A reportagem procurou a assessoria do Tesouro desde a segunda-feira (10) para comentar o relatório, mas não obteve resposta.