Adultização de crianças e jovens preocupa psicólogos

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Tema foi escancarado pelo youtuber e influenciador digital Felca após denunciar casos de adultização para produção de conteúdo na internet - Paulo Pinto/Agência Brasil

Alerj está com projeto de lei para criar política de conscientização e combate à adultização

Por Ana Luíza Rossi

Um vídeo do youtuber Felipe Bressanim, o Felca, publicado em 6 de agosto, viralizou ao expor casos de influenciadores que utilizam imagem de crianças e adolescentes em conteúdos considerados inadequados. A gravação – que já ultrapassa 43 milhões de visualizações no YouTube desde o último sábado (16) – reacendeu discussões sobre os efeitos da chamada adultização infantil e preocupa os especialistas da área.

Ao Correio Sul Fluminense, a psicóloga Erika Barbosa de Araújo, professora da Estácio, explicou que a adultização ocorre quando crianças passam a ser tratadas como adultos, expostas a padrões estéticos e comportamentais que não condizem com sua idade.

– Quando se designa uma maturação “forçada”, considerando o funcionamento psíquico, pode acarretar prejuízos para o desenvolvimento – explica.

Para complementar o tema, a psicóloga Camila Costa reforça ainda que a erotização precoce pode trazer sérias consequências para a vida adulta. “A criança não tem recursos psíquicos para compreender o sexual da mesma forma que um adulto. Quando exposta precocemente, não consegue simbolizar aquilo vivido, e esse encontro pode se tornar traumático”, afirma.

Com a exposição a esses conteúdos, o brincar – parte essencial para o desenvolvimento – perde espaço para o consumo desses tipos de conteúdos e interfere no processo emocional, já que a criança ou adolescente passa ocupar um lugar de objeto do desejo do outro.

– Na visão psicanalítica, isso é natural, a criança busca aprovação, primeiro dos pais, depois no social. A exposição torna-se um problema justamente por conta deste olhar, em sua maioria invasivo e objetificante. A criança e adolescente aprende que precisa performar e tenta corresponder as tais expectativas do público (ou dos familiares) em troca deste “amor” e atenção – explica Camila.

E, com isso, vem sinais claros de alerta com mudanças bruscas de comportamento. “Ausência de interesse em atividades comuns da idade e dificuldades em estabelecer relações sociais podem indicar um processo de adultização”, explica Erika. Futuramente, isso pode impactar vínculos, relação com o próprio corpo e até autoestima.

Para isso, segundo a psicóloga Camila, a atenção deve ser redobrada quanto ao tempo de uso de telas. “É fundamental que haja supervisão e orientação de um adulto responsável, que ajude a criança ou adolescente a elaborar o que vê, preservando seu desenvolvimento e protegendo-o de riscos”, destacou.

Orientações oficiais para o uso de telas

Menores de 2 anos: evitar completamente a exposição a telas, inclusive passivas (como assistir TV ou vídeos).

2 a 5 anos: limitar a no máximo 1 hora por dia, e sempre com conteúdos de qualidade e sob supervisão.

6 a 10 anos: a Sociedade Brasileira de Pediatria recomenda até 2 horas diárias, com acompanhamento.

11 a 18 anos: até 2 a 3 horas diárias, com atenção à qualidade do conteúdo e evitando o uso próximo à hora de dormir.

Projeto de lei

A repercussão do assunto também chegou à Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). O deputado estadual Vinicius Cozzolino protocolou, no dia 12 de agosto, um projeto de lei que cria a Política Estadual de Conscientização e Combate à Adultização Infantil.

A proposta prevê campanhas educativas em escolas, capacitação de profissionais de saúde, assistência social e educação, além da criação de canais de denúncia. O parlamentar afirma que a medida busca proteger o desenvolvimento físico, psicológico e social das crianças.

– Estamos vivendo um momento em que a infância está sendo encurtada. Crianças estão sendo expostas a conteúdos e padrões de comportamento que não correspondem à sua idade e ao seu estágio de desenvolvimento – afirmou Cozzolino.

Sobre o vídeo que viralizou

No vídeo de quase 50 minutos, o influenciador Felca demonstrou como o algoritmo das redes sociais pode recomendar repetidamente conteúdos de crianças em situações consideradas sexualizadas, atraindo perfis de pedófilos. O youtuber chamou esse funcionamento de “algoritmo P”.

No mesmo vídeo, ele também falou sobre a exploração de crianças e adolescentes para produção de conteúdos produzidos para as redes sociais. Um dos casos citados foi do influenciador Hytalo Santos, preso nesta sexta-feira (15) para cumprimento de um mandado de prisão temporária expedido pela Justiça da Paraíba. O influenciador está sendo investigado pelo Ministério Público da Paraíba (MPPB) e pelo Ministério Público do Trabalho (MPT).

*Com informações da Agência Brasil

Dicas para proteger crianças e adolescentes nas redes sociais

Por Mariana Tokarnia – Agência Brasil

As denúncias feitas pelo influenciador Felca Bress, em vídeo publicado na semana passada, colocaram em foco os riscos que as redes sociais representam para crianças e adolescentes e como não há uma regulação sobre o uso de imagens de menores de idade nesses espaços virtuais. As cenas expostas por Felca chocaram e provocaram a reação do Congresso Nacional, da Presidência da República e de diversos setores da sociedade.

Especialistas entrevistados pela Agência Brasil orientam pais, mães e responsáveis sobre como proteger crianças e adolescentes em ambientes virtuais. Além disso, ressaltam o papel das escolas, da assistência social de outros equipamentos públicos na defesa dos direitos dessa parcela da população.

Classificação indicativa

Segundo a escritora, palestrante e ativista pela erradicação da violência sexual e online, Sheylli Caleffi, é necessário conhecer e respeitar a classificação indicativa das plataformas. O Instagram, por exemplo, não é recomendado para menores de 16 anos. O Tiktok e o WhatsApp não devem ser usados por menores de 13 anos.

Os responsáveis devem garantir que as idades informadas estão corretas, uma vez que as próprias plataformas não pedem nenhum tipo de verificação. Além disso, devem observar as configurações, para impedir que qualquer pessoa tenha acesso ao perfil dos menores de 18 anos e que eles recebam mensagens de pessoas desconhecidas.

“Quando você decide dar acesso aos seus filhos nos ambientes digitais, você precisa também olhar a configuração daquilo que você escolheu dar acesso”, diz.

De acordo com a pesquisa do Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), 93% da população brasileira, de 9 a 17 anos, são usuárias de internet, o que representa 24,5 milhões de pessoas. A pesquisa TIC Kid Online mostra ainda que 83% desses adolescentes têm perfil próprio nas redes sociais. Além disso, 30% relataram que tiveram contato com alguém online que não conheciam pessoalmente.

Cuidados ao postar fotos

Mesmo que as crianças não tenham contas em plataformas digitais, Caleffi alerta que os próprios familiares podem colocá-las em risco quando postam fotos ou vídeos delas nos próprios perfis.

“Não são redes sociais, são redes de comércio. Tudo que está lá é para vender. A gente tem que perder essa ideia ingênua de que a rede social é um álbum de foto”, diz.

“Algo que é bacana, até sagrado para muita gente, é erotizado por outras pessoas. Então você tem que imaginar que quando você coloca uma imagem em um local visitado por bilhões de pessoas e por muitos, muitos criminosos, aquilo pode ser tirado facilmente do contexto”, acrescentou.

Isso deve ser levado em consideração por qualquer pessoa que decida divulgar a imagem de uma criança. “Ao divulgar conteúdo com crianças e adolescentes, primeiro você tem que garantir que você é o responsável legal por essa criança. Se eu sou avó, eu não sou responsável legal por essa criança. Se eu sou tio, eu não sou responsável legal. Se eu sou o professor, eu também não sou”, orienta.

Para Caleffi, “ninguém, fora os responsáveis legais pela criança, pode decidir se essa criança terá qualquer imagem exposta nesses ambientes comerciais que são as plataformas digitais”, ressalta.

No entender da ativista, qualquer conta que tenha imagens de crianças ou adolescentes, mesmo que seja de um adulto divulgando as fotos do filho, deve ser fechada. Isso fará com que apenas pessoas autorizadas possam ter acesso aos conteúdos.

Adultização dentro e fora das redes

As denúncias de Felca evidenciaram também o papel das redes para a chamada adultização de crianças, ou seja, crianças e adolescentes colocados em contextos de adultos. Segundo Caleffi, isso ocorre nas redes e também fora delas e podem causar enormes danos psicológicos.

“Muitas coisas adultizam a criança e podem fazer parecer que a sexualização precoce é algo comum. Roupas muito ousadas para a idade, crianças usando maquiagem, usando elementos que são de adultos. Muitas crianças pequenas estão se maquiando, a gente tem problemas de crianças com 9, 10 anos fazendo dieta. Crianças de 4 anos insatisfeitas com o próprio corpo. Onde é que ela está vendo isso?”, indaga.

Para além da exposição na internet, a moderação dos responsáveis sobre o que é acessado é fundamental para que não se tenha contato a conteúdos que possam ser danosos à formação.

“Os pais podem também, além de ter uma conversa muito franca com as crianças sobre quais são os perigos, quais são os riscos, combinar que vai olhar o que está fazendo no grupo do WhatsApp, com quem está conversando. Pode também baixar um aplicativo de mediação parental”, recomenda.

Conforme Caleffi, esse tipo de aplicativo permite, por exemplo, que os responsáveis controlem o tempo que crianças e adolescentes passam diante da tela, permitem o rastreamento da localização deles e produzem relatórios do que estão acessando nos dispositivos eletrônicos.

Além das famílias

A professora associada do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Ceará (UFC) Vládia Jucá, destaca que além do papel das famílias, o cuidado das crianças e adolescentes cabe ao poder público e à sociedade em geral, como está previso em lei, no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

“A gente tem um conjunto de setores e de equipamentos que, articulados, compõem a Rede de Assistência e de Proteção a Crianças e Adolescentes. Essa rede, tanto tem uma função protetiva e de atuação antes da criança e do adolescente se encontrar em uma situação de risco, como também pode ser acionada quando já está numa situação de risco”, ressalta Jucá, uma das autoras do Guia para a articulação entre as escolas e a Rede de Proteção à Criança e ao Adolescente.

Para denunciar situações de abuso ou exploração de crianças e adolescentes, além de outras violações dos direitos humanos, ligue 100 de telefones fixos ou celulares. O Disque 100 é um serviço telefônico gratuito, disponível 24 horas por dia.

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