Caiçaras protestam contra venda de terras em Paraty

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Reprodução/Redes sociais

Por – PEDRO VILAS BOAS – Folhapress-

O jazz que soava no centro histórico de Paraty, litoral sul do Rio de Janeiro, foi interrompido no final da tarde deste domingo (15) por sons de protesto. Um grupo de caiçaras, povo tradicional do litoral brasileiro, aproveitou os holofotes do Bourbon Festival para se manifestar contra a venda de 49 lotes de terra na cidade.

Dezenas de pessoas caminharam pelas ruas da cidade, que estão tomadas por turistas que vieram ao festival, para protestar. “Basta de colonização no Brasil”, “fora leilão” e “nós vamos resistir” eram algumas das frases nos cartazes dos manifestantes.Eder Costa, 33, líder dos moradores da Ilha do Araújo, pediu licença a uma das bandas que se apresentava no evento e subiu ao palco. “As pessoas ficaram surpresas porque nem sabiam que isso estava acontecendo”, disse à reportagem.

Como o UOL mostrou neste sábado (14), a Justiça autorizou o leilão de 49 lotes em quatro municípios do RJ, incluindo a capital, entre maio e junho deste ano. Paraty lidera a lista com 32 lotes, dos quais 29 já foram arrematados, por cerca de R$ 5 milhões no total. O mais caro, um terreno localizado em Prainha da Praia Grande, a cerca de 10 km do centro de Paraty, foi vendido por R$ 665 mil.Depois da caminhada, os manifestantes cantaram e dançaram no cais da cidade.

“Paraty ganhou o título de patrimônio mundial da humanidade por causa dos povos originais, por causa desse povo que ainda resiste. Paraty é terra caiçara, temos que manter as raízes”, disse Viviane Remédios, de 39 anos.Os irmãos Sofia e Tiê Ribeiro, caiçaras de Bijiquara, tentam organizar as comunidades menores de Paraty contra o leilão. Ao contrário da Ilha do Araújo, por exemplo, eles não têm advogados para acionar a Justiça. “Lá não tem luz, saneamento básico. O leilão chegou antes dessas coisas básicas”, reflete Tiê, que trabalha como pescador.

A família de Anderson Pacheco, 48, está há gerações na Ilha do Araújo. Ele conta que não tem dormido direito desde que a notícia do leilão começou a se espalhar. “Você não escuta mais som ligado na ilha, movimentação. Parece uma cidade fantasma. Todo mundo triste”, lamenta.Milionários também estão preocupados com a situação, temendo perder casas de veraneio construídas nas áreas. “São proprietários paulistanos e cariocas de alta renda que utilizam as praias para férias, não são moradores”, conta uma pessoa que acompanha a disputa judicial, sob anonimato.

ENTENDA O CASO

Os terrenos fazem parte do inventário judicial do português José Maria Rollas. Ele adquiriu as terras nas décadas de 1960 e 1970 e morreu em 1988. O espólio está sendo administrado por seus herdeiros. Partes das terras estão em uma APA (Área de Proteção Ambiental) e são ocupadas por comunidades com modos de vida tradicionais, protegidos por legislação federal.Risco de expulsão de famílias que vivem nas terras há gerações. Cerca de 60% dos 750 moradores da Ilha do Araújo e 75 famílias no Saco do Mamanguá podem ser removidos de suas casas.

Advogados alegam que não houve delimitação precisa dos terrenos leiloados. Os advogados Joyce Santi e Onir de Araújo, que representam os caiçaras da Ilha do Araújo, pediram a suspensão do leilão de quatro lotes do local no último dia 9. Eles também solicitaram à Justiça que o MPF (Ministério Público Federal) se manifeste no processo, já que envolve a comunidade tradicional dos caiçaras. “O processo do leilão está cheio de irregularidades”, critica a Santi.

Os advogados também questionam a validade dos títulos das terras de Rollas. Eles também alegam que as comunidades não foram notificadas sobre o leilão e que a delimitação de cada propriedade não está clara na descrição dos lotes.

“Não foram intimados, nem notificados. Não verificaram se tinha alguém no local, por exemplo”, afirma a advogada.Advogado da família Rollas afirma que não há disputa porque os terrenos possuem registros legais. Luiz Nizzo de Moura diz que as terras foram adquiridas legalmente e que a venda é direito legítimo dos herdeiros.

Nem todas as pessoas que vivem ali, possivelmente, têm algum direito patrimonial decorrente de títulos. Os caiçaras, por exemplo, quando eles falam ‘nascemos aqui e aqui ficamos’, é muito provável que tenham nascido em uma ocupação sem justo título e foram ficando.

O ICMBio instaurou procedimento interno, alertou sobre sobreposição com áreas protegidas e notificou os responsáveis pelo leilão. O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade afirma que encaminhou o caso à Procuradoria Federal Especializada e ao Ministério Público Federal, considerando, sobretudo, o risco de interferência nos objetivos de criação da Área de Proteção Ambiental de Cairuçu.

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Correio Sul Fluminense

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